sábado, 25 de setembro de 2021

Pacta sunt servanda e a revisão dos contratos


Pacta sunt servanda é uma expressão latina cujo significado é pactos devem ser cumpridos. Trata-se de um princípio de obrigatoriedade dos contratos, o qual obriga as partes a se submeterem ao contrato, como se este fosse a própria lei, devendo os pactos firmados serem cumpridos a qualquer custo.

Embora na legislação brasileira se espere o cumprimento dos contratos, isto não deve se dar a qualquer custo. Tanto o Código Civil (CC) quanto o Código de Defesa do Consumidor (CDC) relativizam o princípio do pacta sunt servanda, com vistas a tornar justas, quanto possível, as relações contratuais.

Três são as teorias sobre a revisão de contratos relacionadas à relativização supracitada. De acordo com a teoria da imprevisão (primeira teoria), de origem francesa, o Estado-juiz deve rever o contrato, se houver um evento imprevisível e excepcional (extraordinário) que altere o equilíbrio entre prestação e contraprestação. A ideia não é a extinção do contrato, mas sua revisão.
 
No que concerne à teoria da quebra da base negocial (segunda teoria), de origem alemã, se houver mudanças significativas nas bases negociais que levaram à criação do contrato, o Estado-juiz deve intervir para evitar injustiças. Note-se que esta segunda teoria, não se refere à imprevisibilidade ou excepcionalidade, mas a mudanças nas condições negociais iniciais.
 
Já no que tange à teoria da superveniente onerosidade excessiva (terceira teoria), de origem italiana, esta, baseada em normas legais publicadas na Itália, tem similaridades com a teoria da imprevisão, também prevendo imprevisibilidade e excepcionalidade; porém, com os seguintes pontos de diferenciação principais: aplica-se a contratos de duração e, ademais, considera um nível de desequilíbrio contratual exacerbado, em desproporção.
 
As três teorias supracitadas estão presentes na legislação brasileira. No Código Civil (CC), estão presentes a teoria da imprevisão e a da superveniente onerosidade excessiva. A seguir, reproduzem-se artigos relevantes relacionados a essas teorias para o CC:
 
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Código Civil (CC)
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Base: Teoria da imprevisão

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

Base: Teoria da superveniente onerosidade excessiva

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.
 
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

 
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Já no Código de Defesa do Consumidor (CDC), que dá grande ênfase à divulgação de informações detalhadas de produtos e às divergências entre o que é divulgado e o que chega ao consumidor, destacam-se a presença da teoria da quebra da base negocial (preponderante) e da superveniente onerosidade excessiva. A seguir, reproduzem-se artigos relevantes relacionados a essas teorias para o CDC:

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Código de Defesa do Consumidor (CDC)
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Base: Teoria da quebra da base negocial

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
 
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

Base: Teoria da superveniente onerosidade excessiva

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
 
A associação entre as três teorias da revisão contratual, o Código Civil (CC) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) resulta de interpretação das normas constantes nesses Códigos, não sendo possível dizer que houve intencionalidade do Legislador. 


Para mais referências sobre Direito Civil - Contratos, veja indicações aqui, ao final.